“MAS LAÍS COMO ASSIM QUEM É CLARISSA?!?!?!”
... & outras histórias do tempo do ig (além do novo single do dom, retratos, canções e algo completamente diferente – tudo isso pra compensar).
srs. sras.
há quanto tempo.
meu irmão me escreveu reclamando que eu não estava mais fazendo a newsletter, então eu voltei (mas demorei uma semana a mais para ele não ficar pensando que manda em mim).
na vida, tive trabalhos que eu fiz porque decidi que ia trabalhar naquele lugar – foi assim com o fulano e o buzzfeed – e teve lugares para onde eu fui porque precisava de um emprego e eles me ofereceram – foi o caso do ig e da editora símbolo, meu emprego anterior. um foi tudo, o outro me deu o vlad.
trabalhar no ig teve (e deu) à minha vida alguns sentidos, naturalmente por causa da única coisa real capaz de dar sentido para a vida de uma pessoa, que no caso são outros humanos, e não uma marca, peloamordedeus. eu só aconteci de ter encontrado essas pessoas por lá.
hoje eu me lembro de algumas das histórias (e dos sentidos) que as pessoas que encontrei no ig me deram; registro o paralelo que o domenico fez entre o espaço e o amor; tiro um breve retrato para me lembrar das coisas que meus filhos fazem aos 4 anos e 11 meses e aos 11 meses; do nada mando um feat surpresa aí no meio da newsletter e termino exaltando uma chanson dos 90.
é pra compensar.
espero que gostem.
VELHO É O MEU PASSADO
amauri, 299
eu tinha pouco mais que 30 anos quando bati pela primeira vez o crachá na portaria do prédio na rua amauri, número 299. ali funcionava o ig, meu novo empregador.
o ig quando me contratou, você há de entender meu ponto de vista proletário, significou minha saída de um emprego precário, onde eu ganhava LITERALMENTE 1500 pejotinha e pegava dois ônibus e um trem para chegar a um lugar inóspito e passar o dia com uma chefia que não tinha a mais puta ideia de como funcionava a internet.
agora, em vez disso, eu ia:
✅ não só ser CLT (deus abençoe getúlio vargas) mas também ganhar mais que o dobro, ter férias, 13º, vale refeição, plano de saúde e o escambau;
✅ chegar ao trabalho em meia hora de porta a porta, pegando 01 – HUM – mero ônibus dentre 3 ou 4 opções, de forma que eu quase nunca esperava muito no ponto; algum tempo mais tarde, em uma daquelas chuvas monumentais que inviabilizam a cidade nos anoiteceres de verão, descobri que era possível voltar, imagine você, A PÉ do trabalho para casa, uma vitória jamais sequer SONHADA pela menina criada em são bernardo da borda do campo;
✅ trabalhar em frente a uma starbucks quando eu ainda tomava café da starbucks (foi ali que a funcionária mais simpática e fofa do lugar errou meu nome uma vez e eu não tive coragem de corrigir, e desde aí eu passei a falar “laís” como o nome que deviam colocar no meu copo e ATÉ TIVE QUE COMEÇAR A SACAR DINHEIRO PARA PAGAR MEU CAFÉ, COMO UMA FENÍCIA, PORQUE EU TINHA VERGONHA DE DAR MEU CARTÃO PARA A MENINA E ELA FALAR “MAS LAÍS COMO ASSIM QUEM É CLARISSA?!?!?!”, e assim foi minha vida, codinome laís na starbucks em frente ao trabalho, até a menina, para meu alívio, sair);
✅ almoçar em uma região LOTADA de restaurantes que futuramente eu conheceria pelos apelidos de mujeres (não me pergunte), fafarata (diz que um dia apareceu o inseto que rima dentro da lasanha), italianinho (a melhor torradinha de entrada e um suco irrepreensível de mexerica, mas só na época), pussy’s (onde um garçom, ao ouvir do meu amigo a pergunta “o que é aneto?”, respondeu com um pfff e um sorrisinho, e foi embora, deixando a gente sem saber) e o fantástico cozinha do caralho (calma, é só porque era muito longe).
✅ e, o que eu descobriria mais tarde ser o melhor benefício oferecido involuntariamente por esse emprego, ser parte de uma equipe de gente que MORAVA na internet.
então, não tinha a menor chance de eu não amar meu novo emprego. e eu de fato amei, longamente.
as pessoas que eu encontrei lá foram as primeiras que pensavam na vida de uma outra forma, de uma forma que esta menina criada em são bernardo nunca tinha pensado. elas pensavam em morar de aluguel (versus a mentalidade arraigadíssima em mim do sonho da casa própria), viajar para todos os lugares possíveis em vez de gastar com qualquer outra coisa (versus minha ideia geral de que “viagem é luxo”), viver sem carro por opção (versus a mentalidade arraigadíssima em mim de “como assim?, sem carro não dá pra viver” – já mencionei que eu cresci em são bernardo?).
nas pessoas que eu encontrei lá tinha um garoto de 19 anos recém-auto-descoberto gay e uma mulher de 50 com quatro filhos crescidos – e uma miríade belíssima de diferentes existências entre um e outro. tinha nerds de todos os espectros. tinha meninas altamente modernas e intensamente tatuadas que eram um amor (e, como muitas outras, altamente inseguras e um pouco carentes). tinha gente com filha, gente que sonhava engravidar, gente que tinha decidido que nunca ia ter filhos. tinha uma escada de incêndio onde rolaram altos babados. tinha figuras inesquecíveis, tinha quase um personagem que trabalhava por hobby e era tão rico que, depois de demitido, foi buscar as coisas na redação e comentou que planejava comprar 01 (uma unidade) de garrafa de vinho com O DINHEIRO DO SEGURO DESEMPREGO (esse mesmo, as seis parcelas etc). olhando em retrospecto, seria fácil escrever uma sitcom desses anos no ig – até porque o principal, o fio invisível que mantinha as relações em um às vezes tênue equilíbrio, era o humor. a maioria esmagadora das pessoas ali tinham senso de humor.
exceto, naturalmente, os chefes. e particularmente os chefes que entraram para marcar uma nova gestão (o ig passou de mão em mão até desabar num precipício depois de, adivinhe?, uma troca infeliz de gestão) me pareciam os mais mal-humorados.
ok, não todos. mas o segundo diretor de redação que eu peguei lá era daqueles caras que só de subir a notificação de e-mail dele lá no cantinho do outlook meu estômago já dava uma pirueta e se estatelava de ponta-cabeça. mas devo admitir que com ele eu aprendi a trabalhar melhor. e eu acho que eu nunca tinha aprendido a trabalhar melhor em um lugar.
boa parte desse crédito vai para a minha chefe direta na época, a melhor que eu tive na vida. dela, aliás, fiquei muito amiga depois que deixamos de ser chefe e subordinada (eu não sei ser amiga de chefe, acho).
e não foi só dela. do ig eu trago, contando por baixo, pelo menos cinco dos meus melhores amigos ainda hoje. e muitos queridos dos quais talvez eu só não tenha ficado mais íntima por falta de tempo.
a vida de todo mundo mudou muito – a minha inclusive. divórcios, mudanças de cidade, novos casamentos, nascimentos. eu mesma troquei as viagens e a vida sem carro por uma casa de bairro e dois filhos. mas eu não sei de que outra forma eu teria imaginado a vida que acabei levando se eu não tivesse trabalhado ali, naqueles anos, com aquelas pessoas, no ig.
MATERNIDADE E OUTRAS PIRAS
o dom e o infinito
o domenico, como tantas crianças, gosta muito da ideia do espaço sideral.
e uma coisa que eu disse para ele é que o espaço é infinito.
então, ele concluiu que “sideral” só pode ser um tipo de sinônimo para “infinito”.
e daí que quando um dia eu fiz uma dessas perguntas de mãe, “você sabe o quanto eu te amo?”, ele surgiu com a resposta mais involuntariamente poética que eu já vi:
“você me ama sideral”.
e o pior é que é verdade.
retrato de abril
o domenico agora gosta de assistir harry potter (está no quarto, mas tem medo de algumas partes), acha que o vilão chama voldeMORTE porque MATOU os pais do harry, tem um pouco de medo de monstros no geral, cria intrincados mecanismos freestyle usando as peças de lego e os incorpora à cidade de pecinhas que montou, tira e põe a própria roupa, pega coisas no armário usando a escadinha dele, gravou uma música de composição própria como presente de aniversário para mim, está obcecado com números e soma, outro dia mordeu um coleguinha na escola, sabe colocar pasta na escova e escova os dentes e um dia, fazendo isso, virou para mim e falou com visível satisfação, encostado na bancada da pia do banheiro, “até que eu sei me virar sozinho, né?”.
o milo deita no meu colo, oferece o próprio pezinho para eu ‘comer’ e, quando eu finjo fazendo nham nham nham nham nham nham hummmm!, dá muita risada.
AND NOW FOR SOMETHING COMPLETELY DIFFERENT!
o que você vai ler a seguir é uma participação especial que tenho muita honra de receber aqui na minha mui humilde newsletter: um feat da minha parceira de crime de longa data, abridora de caminhos e mina de fé. se liga:
Por um punhado de nomes (a menos)...
Em 2001, mais ou menos abril, eu passava dias e dias ouvindo “precisa casar”. É que eu e o rapaz tínhamos decidido morar juntos - eu já morava, ele decidiu vir morar também naqueles 49 metros quadrados e meio. Bom, era só uma questão geográfica - onde morar - e acabou virando MAIS DE 20 ANOS DE PROBLEMA DE NOME.
Bom, talvez seja injusto resumir tanto. Vamos prolongar a dor.
Foi em junho daquele ano que o rapaz se mudou, foi em agosto daquele ano que, depois de três meses dizendo não e outros três dizendo “ai, tá bom, foda-se, vamos lá assinar o troço e fazer festa”, eu cedi. Cedi vestida de calça jeans e blusa preta acompanhadas de botas pesadonas muito mal julgadas pelos transeuntes.
Na hora de assinar o papel, eu distraí com a conversa. Sim, foi isso, eu-dis-tra-í-com-a-con-ver-sa. Mas era um cartório, tinha que assinar coisas de verdade mesmo, e aí essa distraída botou um sobrenome extra no meu nome. A moça perguntou “kha fulilu kadlie no nome” e eu respondi “ah-hã”, seguindo um papo sobre abacates com minha amiga que serviu de testemunha. E, assim, eu ganhei outro sobrenome.
Não me levem a mal, como o rapaz levou por anos e anos, toda vez que surgiu esse assunto e eu afirmei que o nome entrou porque eu não prestei atenção: não é que eu tenha morrido por causa disso ali mesmo ao perceber a certidão (como devia ter feito ao responder “não bota sobrenome aí não, senhora!”).
Não era horror ao nome dele; nem mesmo assombro ao patriarcado (eu não pensava nisso na época, só uns dois anos depois que “bateu”). Mas era um incômodo. Era estranho. E o incômodo estranho afligiu a minha identidade por décadas.
Nos anos seguintes todos, casados, eu apenas não usava o nome do cartório. Segui assinando meus textos e matérias e projetos afins com o nome que meus pais me deram - curto e grosso, um orgulho pra mim, sem nomes do meio ou guerra de sobrenomes (ainda que eu ache absurdo não ter o Machado da minha mãe sempre à disposição). O nome “de casada” só aparecia grafado nas passagens aéreas e outras finalidades menos felizes.
Foi então que perdeu-se o amor, o compromisso perdeu-se também e, num outono deselegante e meio sombrio de 2017, assinamos o divórcio. Sem ressentimentos e seguindo em frente. Mas só a segunda parte é verdade.
Sobrou dívida de apartamento, sobraram farpas trocadas por algumas mídias, e sobrou, infelizmente, o sobrenome extra. Não era meu. Nunca foi. E eu não queria, de qualquer modo. Eu queria o meu nome, na íntegra. Queria voltar a ser quem eu sempre fui mesmo. Mas o sistema financeiro e institucional não concorda com esse pensamento reto.
Por mais que essa seja uma questão pessoal, botar ou não o nome do cônjuge pra deitar com o seu, é importante que os jovens saibam das implicações eternas disso. AS jovens, na realidade, porque é raro o contrário - um cara aderir ao sobrenome da garota (apesar de permitido pela lei desde 2002).
Por que será, não é mesmo? Minha suspeita é que se trata de poder. Isso deve incomodar pra valer o homem; ele não usar seu nome familiar tira dele uma essência, um comando e uma postura da qual não se sente bem em abrir mão. Parece perder a ancestralidade. Parece que seus bisavós virão dar chutes na sua bunda em plena madrugada. Pois é. Eu entendo. MUITO MESMO.
Entendo porque foi assim que me senti todas as vezes que chegou um cartão de crédito da conta bancária que EU mantenho suando frio e lá veio escrito um nome extra. Foi assim, em segundo plano, como uma filial, que eu me senti sempre que o nome dele era citado inteiro e o meu como “mais um”.
E não é psicológico, como o frio, é físico mesmo. Os processos nunca acabam. Troquei RG em uma modorrenta tarde inteeeeira no Poupatempo. Troquei a carteira de habilitação em outra tarde de inundação inteeeeira em outro Poupatempo. Mas o CPF, ele não acompanhou as tardes caóticas: ele ainda está em processo porque o Banco do Brasil e a Receita Federal são tão ligados quanto eu e meus primos de terceiro grau.
Aí, a conta no banco também não muda, assim como o Imposto de Renda e tudo o que é conectado nesse cadastro da pessoa física que se distraiu no cartório falando sobre abacates. Agora tem também o Título de Eleitora entrando na jogada - e tudo o que eu espero é poder votar pra destituir esse governo fascista escroto em 2022 com meu nome e no domicílio perto de casa.
Um dia vai estar tudo certo. O nome completo será aquele, de nascimento, e vai vir a plenitude até se for pra estar no Serasa - endividada, mas me chamando eu mesma. Presa, mas com o nome certinho.
Ficarão as memórias, as boas e as ruins, e ficarão as duas filhas que a gente começou a ter muitos anos passados. Elas, aliás, têm nome, sobrenome da mãe, sobrenome do pai. Boa parte de mim torce e prega, como uma arcebispa da identidade pessoal, que assim seja para sempre - estando elas distraídas ou não.
* * * * *
Mas toda história tem seu fim. Mesmo quando envolve o Cadastro de Pessoas Físicas, CPF, esse grande burocrata.
Em uma tarde de sol de fevereiro (sol mesmo, a pino, um dia daqueles em que eu me torno o Conde Vladimir morador do Jardim Transilvânia, e pago pra ficar em casa) e me deu uma coisa. Isso, “me deu uma coisa” de ir no Banco do Brasil e resolver essa desgrama. Peguei todos os meus documentos, certos e errados, coloquei em uma pastinha, meti debaixo do braço e fui tostando a cabeça, ponderando no caminho se implorar de joelhos em um local público dá cadeia ou sanatório.
Já no banco, começou bem: “tá aqui uma senha, passa aquela porta giratória, desce as escadas, espera sua vez no caixa, diz que vai pagar a taxa pra mudança de nome e reza duas Ave Maria”. Essa última não teve. Eu rezei mesmo assim.
Demorou nada, porque ninguém mais vai ao banco. Demorou mais para a porta giratória aceitar que eu não sou assaltante do que para acessar o operador de caixa e receber, por R$ 7,20, meu passaporte da alegria rumo à mesa da gerência.
Sim, outra porta giratória (igualmente desconfiada) e mesa da gerência. Demorou um pouco, porque todas as cinco ou seis mesas estavam ocupadas. Chutei que eram empréstimos e provas de vida… porque se EU acho que tenho problemas, nem vamos falar sobre senhorinhas que precisam ser transportadas de muletas até o guichê pra provar que são elas e tirar um reais…
C272. Sou eu. Sentei ereta, como quem quer provar ser boa pessoa, sim, mesmo querendo mudar de nome uma segunda vez. Na primeira vez, pós advento do fatídico casamento, teve toda essa turnê para acrescentar. Naquele dia, sob 36 graus e sem ventilador no BB, era pra tirar. A Receita Federal que me perdoe a trabalheira (eu é que não a perdoo pelo vandalismo de não ser digital).
Priscila me atendeu. E Priscila entendeu rapidinho o caso e passou a esmurrar os dedos no teclado rumo ao sistema para fazer a alteração, checando meus documentos com olhos de águia. Priscila, percebendo meus dedos tamborilando um samba triste na mesa, passou a fazer perguntas. Divórcio? Filhos? Ficou com a casa? Dívida, é? Pagou tudo? Crianças bem? 17 e 11, jura, com essa cara de menina?!
Eu gostei da Priscila gratuitamente, mesmo ela me pedindo o comprovante dos R$ 7,20. Ela tem o nome de uma das minhas melhores afeições e ela realmente perguntou porque queria saber. E porque queria se solidarizar. Priscila também divorciou. Também alterou nome. Um filho. Dívida. Não pagou. Mudou. Não vai casar de novo jamais, homem dá muito trabalho e ela gosta de ler.
Na fé que o sistema aceitasse tudo como a gente já tinha aceitado anos atrás - e ele levou 45 minutos pra isso, mais que eu… - eu e a Priscila forjamos com olhares um pacto de não desistência. Eu duvidei, pra ser sincera, mais do que muitas vezes que fosse acontecer ali, naquele dia. Mas a Priscila estava com o ímpeto do “ou esse nome muda hoje ou eu não me chamo meu nome regularizado frente à Receita”.
Mudou. Assim, mudando. A impressora até cuspiu um papel para comprovar. Eu alisei esse papel com uma emoção bem maior do que seria cinematograficamente aceitável.
Agradeci a determinação da Priscila. Desejei tudo de bom e disse que abraçaria se não fosse a pandemia. Ela aceitou a intenção e a gente se despediu com boas sortes e um olhar de “é, eu sei”.
Flávia Pegorin ganhou a calçada feliz, mesmo sob 36 graus. Agora? Agora é distrair.
LIBERTA, DJ
it's the one good thing that i've got
a primeira vez em que ouvi freedom ‘90 eu tinha 12 anos e a música tinha acabado de ser lançada. não me lembro com exatidão da PRIMEIRA-PRIMEEEEIRA vez, mas me lembro de achar a música, de certa forma, contagiante e meio épica. e tinha o videoclipe – me lembro da roberta me explicando porque eu tinha que gostar daquele clipe, como ela pacientemente fez me introduzindo a muitos signos da adolescência que eu tentava ignorar, e naquele ano inaugural dos 90 poucas coisas eram mais simbólicas que a cara da linda evangelista e um CD PLAYER, as duas primeiras coisas que aparecem no clipe (fora a atemporal chaleira em cima do aquecedor).
acho que só entendi sobre o que freedom ‘90 era alguns anos depois. (olhando em retrospecto, sempre me pergunto onde é que a gente estava com a cabeça durante os anos 80 para acreditar no george michael como símbolo sexual hétero, mas é aquilo, né, depois é sempre fácil falar).
quando soube que era uma música sobre o artista rompendo com o próprio passado, freedom ‘90 ganhou mais credibilidade para mim, adicionada à sua vocação natural de música para cantar com a mão no peito e os olhinhos fechados, cabeça ligeiramente inclinada para trás, refrão épico, coro e tals.
mas quando li a letra pela primeira vez, mais uns pares de anos adiante, aí sim o impacto real bateu. todo mundo pode se relacionar com o depoimento de alguém que rompe com seu próprio passado e se apresenta de novo para o mundo, ansioso para saber se ainda vão gostar dele ou não.
desde então, freedom ‘90 NUNCA parou de bater para mim.
a música é praticamente um dos maiores hitmakers dos anos 80 aproveitando o réveillon da virada da década para falar “olha, gente, então, essa papagaiada aí que eu fiz até agora foi bacana mas minha intenção é ser outro tipo de cantor ok?”, mas não é difícil pensar nela com um discurso de subtexto sobre a sexualidade do artista, embora ele só viesse a falar sobre isso diretamente quase no fim da década, em 98.
então, em retrospecto, quem sabe no subtexto ele estivesse falando
“olha, gente, então, eu sou gay tá, bem gay mesmo, MT GAY, eu sei, loko né, mas às vezes as aparências enganam kk bom o fato é que eu adoro cantar mas não gosto mais de fingir então posso continuar aqui cantando outros tipos de rolês para vocês e sendo gay?”
só que ele faz isso com elegância, engenhosidade, poesia. e um coro matador guiado por um solista impecável (no caso ele mesmo).
tá tudo lá. o jeito que ele aceita o passado, sem renegar a fase juvenil, reconhecendo a amizade com o ex-parceiro de banda no wham!:
heaven knows we sure had some fun, boy
what a kick just a buddy and me
we had every big-shot goodtime band on the run, boy
we were living in a fantasy;
o jeito como ele reconhece com carinho e gratidão a fase sex symbol adolê:
i was every little hungry schoolgirl's pride and joy
and I guess it was enough for me,
ele traça uma linha claríssima e avisa que VAI ATRAVESSAR, SIM:
but today the way I play the game is not the same, no way
think I'm gonna get me some happy
e sugere um jeito de contemporizar passado e futuro:
all we have to do now
is take these lies and make them true somehow
sem contar aquele apelo direto ao ouvinte e irresistível do começo, a proposta de um pacto que nenhuma pessoa em sã consciência poderia recusar:
i won't let you down
i will not give you up
gotta have some faith in the sound
it's the one good thing that I've got
i won't let you down
so please don't give me up
because I would really, really love to stick around
essa música está fazendo TRINTA E DOIS anos e continua ressoando na minha cabeça, contagiante como o apelo de um cantor que era gay e queria mudar os rumos da carreira no começo dos 90, e meio épica como o lugar que acabou ocupando na história. i just hope you understand, sometimes the clothes do not make the man.
Tou indo buscar filho caçula no colégio e querendo comentar tudo.
Se tivesse marca texto ia pintar geral.
Quero rolê para o lançamento do single do Dom.
Fla,companheira de " que bosta de sobrenome de marido ".
Embora ainda casada,sigo detestando o apêndice.
Bjocaa
amiga, que ABRAÇO foi ler essa edição!!! <3
primeiro: esse resumo de como foi conhecer vocês (você + todos aqueles que você sabe quem são) e o que isso causou na minha vida.
"as pessoas que eu encontrei lá foram as primeiras que pensavam na vida de uma outra forma, de uma forma que esta menina criada em são bernardo nunca tinha pensado. elas pensavam em morar de aluguel (versus a mentalidade arraigadíssima em mim do sonho da casa própria), viajar para todos os lugares possíveis em vez de gastar com qualquer outra coisa (versus minha ideia geral de que “viagem é luxo”), viver sem carro por opção".
depois: ler a flá de novo, as histórias do ig (reconhecendo os restaurantes e a starbucks dos encontros pré-cinema/show/bar), as dos seus meninos e uma minibio de uma das músicas preferidas da vida.
eu estava precisando e não era pouco!
vamos marcar o show de apresentação do single do dom, por favor!